quinta-feira, 22 de maio de 2014

Apaziguados


Percorremos a cidade a correr, vimos coisas de espantar, apreciámos pintura, arquitetura, elevadas produções que tiram o ser humano dos seus limites e o levam a impossíveis. Ficámos maravilhados. Ficámos estafados. Parámos num relvado, ao sol, deixámo-nos invadir através da pele, que absorve o calor suave e doce, comemos, crianças corriam e riam. Deixámo-nos estar. Respirámos fundo e deixámo-nos estar outra vez. 
Muitos anos depois, não nos lembramos de uma boa parte dos sítios onde formos, nem das obras que vimos. Preservámos, no entanto, o cheiro daquela relva, a temperatura e a aragem, as combinações de luz e de sombra, os sorrisos que trocámos, o apaziguamento que sentimos.
Sentir apaziguamento é algo que se guarda, na despensa das reservas, a que se volta para comer chocolate.

terça-feira, 25 de fevereiro de 2014

Amanhã é que é




Demonstrar, através da minha própria atuação neste blog, facetas da natureza humana não era minha intenção. Porém, acontece aqui e agora. Decorreram quatro meses desde que, com energia, determinação, vontade férrea e a certeza de que todos os dias, sim, todos os dias sem exceção, ou com poucas exceções, alimentaria este sítio, quanto mais não fosse com uma citação brilhante de algum autor excecional, que as há qb, com alguma essência contida numa poesia extraordinária, com alguma música que teria tudo a ver com uma qualquer faceta humana que pretenderia salientar, com uma obra de arte ou uma notícia sobre coisas fantásticas realizadas por pessoas, tudo evidências de algo extremamente relevante que seria relativamente simples transformar em posts. Isto, claro, em dias em que a minha própria criatividade não me permitisse contribuir de modo aceitável e, com a escrita possível, debitar umas banalidades ou, se tudo corresse mesmo bem, umas originalidades que outros já tinham formulado melhor, mas eu não sabia, sobre a natureza humana.
Naturalmente que nada disto aconteceu. A natureza humana foi mais forte e, todos os dias, determinou que no dia seguinte, ou na semana seguinte, ou mesmo no mês e ano seguintes é que seria. Pelas mais variáveis e excelentes razões. A mais clássica, a falta de tempo. Depois uma que se formula mais ou menos assim “Quando acabar uma coisa qualquer, então sim, tudo vai ser diferente e vou começar a sério com isto.”, seja isto o que for. Seguem-se dias em que não se consegue, simplesmente não sai nada, dias em que se está out, dias em que se as vinte e quatro horas fossem quarenta e oito o resultado seria o mesmo, não chegariam. Para estes estava planeada uma solução: ter uma reserva de posts que ficariam em caixa e poderiam entrar, um pouco como fazem os jornais com algumas notícias que podem sair quando calhar.
Naturalmente que essa reserva não foi feita. Pelas mais variáveis e excelentes razões, de que me permito destacar, neste contexto, a natureza humana, ela própria.